quinta-feira, 28 de abril de 2011

Ética Pública e Formação Humana II


A postagem desta semana é a segunda parte (2/3) do artigo de Sidney Reinaldo da Silva. Boa leitura a todos.


A ética pública do liberalismo econômico

O ideário liberal apresenta ora posições mais conservadoras, ora menos conservadoras em relação à desigualdade social e de como lidar com ela. Como defensores mais eloqüentes do ideário moral capitalista, Hayek e Nozick propõem o Estado mínimo e defendem que apenas o
mercado efetivamente distribui, de forma justa, os bens produzidos pela co-operação social. Com isso, atacam a intervenção pública no mercado, alegando que os mecanismos políticos de redistribuição são injustificáveis do ponto vista ético. A ilegitimidade do Estado deve-se à idéia de que o poder público não seria isento, expressando um padrão ou utopia imposto por uma parte a outra da sociedade. Essa isenção ou falta de comprometimento ideológico e social com utopias ou ideários morais apresenta-se como o valor maior defendido pelo neoliberalismo. Nessa perspectiva liberal, somente o mercado deve ser decisivo na redistribuição dos bens sociais, pois o planejamento e medidas redistributivistas, por onerarem a propriedade privada, são vistos como ineficientes e totalitários. Já os pensadores liberais, que admitem a intervenção do Estado na economia no sentido de corrigir os efeitos “perversos” do mercado, tais como a concentração de renda e desemprego, são vistos como radicais em relação a certos valores básicos do capitalismo, na medida em que, de certo modo, tornam relativo o direito à propriedade. Contudo, esses autores apresentam-se também sempre comprometidos com a “estabilidade” do
sistema capitalista, e com o restabelecimento de uma justiça supostamente inerente ao mercado. As tendências do poder público nas sociedades capitalistas, no sentido de atuar conforme uma visão mais ou a menos conservadora da ética pública liberal são correlatas das estratégias políticas para a garantia da “ordem” social capitalista.
A concepção moral inerente à tradição do liberalismo econômico supõe que a distribuição mais justa de recursos e bens é aquela que resulta da livre interação dos homens no mercado, e de que a desigualdade dela resultante deve ser aceita como o produto de uma harmonia natural ou equilíbrio das tendências econômicas inerentes ao jogo da oferta e da procura dado pela concorrência entre os agentes no processo de produção e troca. Isso seria natural e, portanto, ético. Para os liberais ultraconservadores, a naturalidade desse processo deveria ser aceita como justa qualquer que fosse o seu resultado. Malthus foi o maior defensor dessa moralidade natural.
Malthus (1963, p. 25) elabora uma ética fundada na natureza para justificar a desigualdade e a miséria. Nesse sentido, ele propõe a lei da população. Segundo esta, um agrupamento humano cresce em progressão geométrica: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64... e com uma rapidez muito maior do que
o crescimento dos meios de subsistência, que se daria em progressão aritmética: 1 2, 3, 4, 5, 6... . Ocorreria, portanto, um desequilíbrio entre os recursos naturais e as necessidades dos indivíduos, e o resultado seria a miséria de grande parte da população. Ele é pessimista em relação às condições de progresso econômico e moral da humanidade. Para o autor, quem
nasce num mundo já ocupado não tem direito a reclamar de nada. O mundo, lastima Malthus, é irremediavelmente drástico para os miseráveis. Para estes, não há lugar no banquete da natureza. Eles serão renegados pela própria essência das coisas. A natureza intima, define a sorte dos indivíduos, e não tarda a executar sua sentença. Assim seria justificado, pela própria necessidade brutal da realidade, o aumento da mortalidade devido à fome. De acordo com o autor, nada se poderia fazer para superar tais condições. Qualquer solução pública para melhorar tal situação seria apenas um paliativo indevido.
Malthus justifica moralmente a miséria gerada pelo liberalismo econômico. Mas esse tipo de visão sombria do mundo liberal e da necessidade da miséria que ele gera foi questionado já por Adam Smith. Este autor não escreveu apenas um tratado sobre a economia, mas também sobre a moral. Sua defesa da ordem capitalista filia-se à tradição de pensamento moral iluminista.
Com os filósofos escoceses, durante o Século XVIII, surgiram novas teorias morais como parâmetros para a ação pública. É destacável, nesse contexto, a idéia de senso moral inato e comum. A concepção de uma faculdade moral específica apareceu na obra de Shaftesbury (1671-
1713), intitulada Investigação sobre a origem de nossas idéias de beleza e virtudes, em 1725. Segundo esse autor, Deus proveu os seres humanos de um senso moral para se orientarem. Trata-se de um senso de beleza e de ação. Os juízos de valores fundar-se-iam nesse senso moral e não nas operações intelectuais. Nesta mesma linha de concepção da ação, o pensador Hutcheson (1694-1746) propõe que o senso moral humano é essencialmente altruísta. A suposição de um senso moral e estético preconiza uma espécie de harmonia moral que produziria um consenso a respeito da boa ordem social. Essa filosofia tornou-se uma base para o combate à concepção de indivíduo belicoso, que foi defendida por Hobbes.
É destacável também, no contexto dessas discussões de filosofia moral, o pensamento de Mandeville (1670-1733), nascido nos Países Baixos. Partindo da tese hobbesiana, ele visa provar o contrário do que propôs o autor do Leviatã. Conforme o texto Fábulas das abelhas, de Mandeville, publicado entre 1714 e 1729, o resultado da busca egoística do interesse individual, de forma surpreendente, beneficiaria toda a sociedade. Segundo a conhecida fórmula do autor, que aparece como subtítulo de sua obra, os “vícios privados” produziriam “benéficos públicos”.
Sendo assim, as paixões e os impulsos egoístas são os motores da economia. Portanto, não se deve reprimi-los para que se preserve a prosperidade social (Nicol, 1992, p. 16).
Na segunda metade do século XVIII, surge a filosofia moral de Adam Smith (1723-1790), que se tornou mais conhecido por sua obra no campo da economia. A sua Teoria dos sentimentos morais, publicada em 1759, foi complementada com as idéias desenvolvidas na obra A riqueza
das nações, aparecida em 1776. Nesta obra, as idéias de Mandeville são apropriadas para explicar a natureza do mercado. Contrabalançando ao egoísmo, concebido como o motor da ação econômica, Smith concebe, em sua obra sobre a moral, a idéia de simpatia. Com isso, o autor combate não só a tese hobbesiana do egoísmo como algo básico da natureza humana,
mas também as concepções racionalistas da moral, para as quais a virtude depende meramente do conhecimento (Smith, 1992, p. 138 e ss.).
Segundo Smith (1992, p. 31), por mais egoísta que seja o ser humano, há algo nele que o levaria a se interessar pelo bem-estar dos outros, ainda que nada obtivesse a não ser o prazer da ação. A base desse sentimento de simpatia é a imaginação. Por meio dela, “nos colocamos no lugar do outro, concebemos estar sofrendo as mesmas dores, entramos, por assim dizer, em seu corpo, e, em certa medida, nos convertemos em uma mesma pessoa” (ibid., p. 32). Do sentimento de simpatia originária e da experiência de aprovação e reprovação de casos particulares de méritos ou deméritos, surgem regras gerais de condutas (ibid., p. 109-110). A partir de tais regras, as próprias tendências perversas do amor próprio poderiam ser corrigidas (p. 111). A idéia de sentimento moral terá uma grande repercussão nas teorias morais do Iluminismo francês. Com
Smith, a moral e a economia são reconciliadas: não haveria incompatibilidade entre egoísmo e o sentimento de simpatia. Assim, o autor forneceu uma justificativa moral para propor o liberalismo econômico como a melhor opção para a justiça e a prosperidade dos povos. Essa alternativa tem sido usada como contraposição ao pessimismo moral de Malthus. Os liberais
não-malthusianos apresentam-se dispostos a aceitar alguma forma de ajuda aos miseráveis. O mínimo social ganha sua razoabilidade dessa benevolência moral, supostamente inata e universal.
A teoria do mínimo social está em completa sintonia com a tradição liberal. Mas não se trata de fazer justiça em nome do ideal moral substantivo. Nesse sentido, a proposta liberal já estaria presente em Locke, para quem cada indivíduo tem direito àquela porção da abundância de outrem, “que possa afastá-lo da extrema necessidade” (Martins, 2003, p. 645). No Brasil, devido às diretrizes dadas ao poder público, as políticas sociais tendem a manter a estabilidade do capitalismo e suas iniqüidades históricas, mantendo intactas as estruturas geradoras da concentração de rendas. A renda mínima, na medida em que é concebida conforme a tradição econômica liberal, distancia-se e atravanca a implantação de um beneficio formulado como um “embrião de uma renda universal socialista”.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

terça-feira, 19 de abril de 2011

Ética Pública e Formação Humana I

A postagem desta semana é a primeira parte de um artigo de Sidney Reinaldo da Silva, professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Boa Leitura a todos.


RESUMO: Neste texto, discuto, a partir da teoria da justiça, como as políticas sociais afetam a formação moral de um povo. Partindo do nexo entre ética pública e formação humana, analiso as tendências morais da concepção de “mínimo social”: destaco a forma de ação pública correlata da concepção de justiça social, que se apresenta como receituário para as políticas sociais em sociedades reguladas pelo mercado. Critico a base moral das políticas sociais no Brasil, que propõem a autonomia dos indivíduos garantida pelo “mínimo social”. Apresento um quadro de concepções de justiça social compatíveis com o capitalismo e as políticas públicas correlatas delas, tendo como contraponto a junção entre neoliberais e comunitaristas, entre autonomia da pessoa e res ponsabilidade social. Aponto impactos e impasses éticos-políticos, na formação humana, da submissão da política social no Brasil ao padrão neoliberal.


Este texto oferece elementos para a crítica das tendências das políticas sociais no Brasil. Estas têm sido marcadas por uma ambígua concepção de justiça, na qual se destacam as idéias de eqüidade, mínimo social, reciprocidade e responsabilidade social, cooperação e solidariedade,
de modo a compatibilizar esses elementos com o mercado e a acumulação capitalista nos padrões mundiais recentes. Inicialmente, analiso os fundamentos morais da concepção liberal de justiça e seus impactos na política social. Mostro como o parâmetro do mínimo social molda a concepção de inclusão e o aspecto conservador dessa forma de enfocar a sociedade e as políticas públicas. Apresento um breve histórico das concepções de justiça compatíveis com o capitalismo e as políticas públicas correlatas delas. Finalmente, questiono as tendências da política social no
Brasil frente a sua submissão ao padrão neoliberal, especialmente as que estão diretamente vinculadas à formação humana, e a concepção de autonomia dela correlata.

Ética pública e formação humana

Ao se produzir ordem social, são criados padrões coletivos segundo os quais as pessoas são formadas. A política constitui-se no processo coletivo intencional de produção de ordem, de instituições sociais, no interior das quais os indivíduos são formados. A ética pública diz respeito
às decisões coletivas, às escolhas que pertencem a todos ou cujos efeitos atingem a todos (Veca, 1999, p. 5). Uma investigação no prisma da ética pública visa à forma pela qual as autoridades públicas repartem, no âmbito das decisões políticas, as vantagens ou desvantagens, os custos e
os benefícios, os recursos e os direitos entre membros de uma coletividade. É tarefa de uma ética pública racional évaluer la politique, investigando a concepção de sociedade justa que a sustenta, bem como o critério ou conjunto de critérios que definem o que vem a ser o bem estar e os
direitos das pessoas. A discussão da ética pública permite compreender as tendências da formação humana numa coletividade. Ambas expressam um mesmo padrão vigente de moralidade.
Nas sociedades capitalistas contemporâneas, o padrão que direciona as ações humanas, constituindo-se num imperativo, numa necessidade racional, é a lógica do capital, princípio de ação individual, coletiva e pública. É partir dela que são reguladas as atividades humanas. Assim,
a moral é pensada como capital social e como tal deve ser formada. São as relações de mercado, a lógica dos negócios, o desenvolvimento de competências adaptativo-competitivas que definem os parâmetros éticos deformação humana, que estabelecem o que é ser autônomo.
Há, nas sociedades capitalistas recentes, um nexo entre ética pública e formação humana cuja análise mostra os fundamentos morais da concepção de “mínimo social”, termo que indica o que cada pessoa necessita para ser considerada moralmente competente: autônoma. Esse mínimo define o que a sociedade deve proporcionar a todos, sem o qual uma pessoa perderia a capacidade de se inserir dignamente na vida coletiva, diga-se, no mercado. A concepção de mínimo social restringe o âmbito de ação do poder público. Assim, discutir as políticas sociais a partir da idéia de mínimo social é uma forma de investigar a concepção de justiça liberal.
O termo liberal é polissêmico e seus usos podem gerar uma série de confusão, uma vez que a “hegemonia liberal se manifesta de diversas maneiras” (Martins, 2003, p. 619). Defino a ética liberal como aquela em que está suposta a autonomia das pessoas como agentes individuais e
racionais, em oposição às concepções que afirmam que semelhante autonomia não existe a não ser como produto do reconhecimento coletivo, fato indissociável da política, da cultura e da tradição. Na perspectiva econômica, a visão liberal opõe-se à concepção socialista da economia, sobretudo à idéia de controle social democrático (político) do mercado e da propriedade privada dos meios de produção, bem como da presença de um Estado interventor, empreendedor e capaz de alocar recursos para promover a justiça distributiva, no sentido de criar igualdade de condições sociais. Neste caso, o Estado, e não o mercado, é a esfera moral mais abrangente em que o reconhecimento recíproco das pessoas se efetiva, na forma de definição do que cabe a cada um. Como esfera moral, o Estado caracteriza-se na forma de uma intencionalidade coletiva, como uma vontade comum que se constrói politicamente.

Ordem social e justiça liberal
As instituições sociedades se configuram em padrões econômicos, culturais e ético-políticos. Esses padrões são correlatos de uma ordem historicamente construída. A ordem social pode ser chamada de “autogerada” somente no sentido em que ela resulta da atividade dos seres humanos, que são seres sociais, não sendo, portanto, definida por um ser supremo fora de nosso mundo, nem muito menos resultante meramente de nossas tendências biológicas, tais como se verificaria numa colméia ou num formigueiro. A ordem social é autogerada coletivamente a partir da produção e reprodução coletiva da existência humana. Essa empreita, transformando-se constantemente de acordo com as re-configurações da correlação de forças econômicas e ético-políticas, possui uma dimensão histórica radical, pois tudo está em um processo, em um “devir” contínuo. A história não dá saltos, nada acontece sem ter sido preparado, sem que condições específicas não tivessem possibilitado o advento do novo. A ordem social é construída historicamente e só é criticamente compreensível segundo a configuração das forças sociais em dado momento, o que pode ser investigado a partir da pergunta sobre a quem ela serve.
Essas forças expressam o entrelaçamento das relações de poder econômico, político, técnico-científico, comunicativo e bélico. Devido ao caráter instável da configuração e constituição social, nenhuma ordem, padrão de reconhecimento entre as pessoas, em relação ao qual se estabelece o que cabe a cada uma fazer, ceder, oferecer e receber, deve ser entendida fora do processo contraditório de destruição e criação de padrões, da desordem que lhe é correlata, das ações que não se enquadram nos padrões de reconhecimento estabelecidos num determinado momento, mas que os tornam relativos.
O poder público tem-se definido como esquema de constrangimento, capacidade de definir prioridades para a coletividade, controle dos meios de produção e reprodução da existência social e dos meios de persuasão e de repressão. A sociedade é desigual porque a partilha do poder econômico gera diferenças históricas definidas pela divisão social do trabalho e da propriedade. Assim, a desigualdade de poder de consumo é apenas a ponta do iceberg da configuração das forças sociais, do processo histórico segundo o qual uma sociedade se constitui. A ordem expressa nas leis constitucionais que modulam juridicamente uma sociedade reflete e justifica a configuração de forças históricas, que define como os frutos da co-operação social são diferentemente apropriados.
A idéia de co-operação social, especificada pelo hífen, mostra que numa sociedade não há ninguém fora dela, a não ser os que não podem ser subsumidos pela ordem em questão, aqueles que não são determinados pelas suas relações de poder. Mas, frente à amplitude mundial da sociedade humana, em que o capital (produção, comércio, consumo, comunicação) integra todos os cantos da terra num vasto processo de expropriação e acumulação, dificilmente alguém estaria excluído da co-operação social. Cooperar significa operar juntos, seja no sentido cristão e comunista de cooperação e ajuda mútua, seja no sentido agônico de competição e mesmo guerra. Nesse sentido, vale o dito de que todo negócio é uma guerra e toda guerra é um negócio, pois os limites da co-operação, do operar juntos, são dados pelo que uns podem fazer dos outros, que tem como extremo a eliminação física do outro. Tal como o negócio e a guerra, a política é uma
forma de co-operação. A co-operação não exige ou supõe necessariamente o entendimento, o acordo. Ela supõe alguma forma de contato, de estar envolvido numa configuração de poder, em um sistema de relações, em que tudo se desloca e se intercambia. A concepção crítica de rede serve como um esquema para se pensar a co-operação e a forma como todos estão necessariamente em contato móvel.
Na perspectiva pragmática do mercado, ainda que um mundo social ou cultural seja intraduzível para um outro, isso não significa a impossibilidade de se construir pontes entre eles. Sempre é possível estabelecer trocas de algum valor, mesmo que não haja entendimento. As trocas podem ser feitas mesmo quando não há um justo sistema de equivalência. Pode se trocar ouro por espelhos, como a história tem mostrado. O mundo humano envolve um vasto sistema de co-operação, mesmo que não haja entendimento cultural, lingüístico, político, econômico. Mesmo a guerra é uma forma de co-operar, de fazer coisas em conjunto, em que pessoas, grupos, classes e povos encontram-se dentro de uma certa configuração de força, que, neste caso, tende a resultar no esmagamento ou submissão total ou parcial do outro. O operar juntos é um imperati-
vo da existência humana. Contudo, nem todas as formas de se operar juntos são aceitáveis e dignas de não serem combatidas. A questão central ético-política é a de como construir uma ordem social justa correlata a um processo de criar e partilhar valores co-operativos como base para a formação do ser humano.
A definição da forma justa ou injusta de co-operação se dá historicamente. No mundo social não há um fora, nem no tempo e nem no espaço. Nele entramos pelo nascimento e só saímos com a nossa morte. É a “natureza”, um limiar instável da historia humana, que determina, inicialmente, as condições biológicas de nascimento e morte que nos incluem e excluem na sociedade. Mas as configurações da sociedade (nossas formas de produzir a existência, a cultura e a linguagem historicamente implicadas nela) perpassam nossa existência individual, que se dá no intervalo entre o nascer e o morrer. Desde o nascimento, já entramos na correlação de forças sociais. Estas são definidas pelas condições históricas em que nascemos, vivemos e morreremos.
A questão básica é a de saber até que ponto o poder publico nacional pode controlar as condições de co-cooperação entre nós, de controlar o padrão de ordenamento das instituições sociais, que são estruturas nas quais as relações de poder se expressam. O ordenamento da produção e da propriedade é dado por um padrão de co-operação, que define socialmente as formas válidas e inválidas de se produzir, apropriar, comercializar e consumir bens. Essa regulação tem sido modulada pelo mercado e/ou controlada pelo Estado, que se apresentam como duas fontes morais de regulagem social, ora compatíveis, ora incompatíveis.
Para os defensores do capitalismo, o princípio da eficiência do mercado é o definidor legítimo do padrão de justiça liberal. Segundo Nozick (1994), esse “padrão” expressa as formas válidas de aquisição e transferência de bens. Justa seria toda aquisição e transferência de bem feita segundo as normas tradicionalmente aceitas por uma sociedade liberal, não importando o resultado das transações, ou seja, a concentração de riquezas e a desigualdade social geradas. Sendo assim, supõe Nozick, o capitalismo seria o melhor sistema, pois nele o padrão não resultaria de uma utopia imposta por uma parte da sociedade à outra. No capitalismo, ter se-ia uma sociedade em que as pessoas “têm liberdades de se associarem voluntariamente para seguir e tentar realizar sua própria visão da boa vida na comunidade, mas onde ninguém pode impor [grifo do autor] sua própria visão utopista aos demais” (1994, p. 338).
Embora concorde com Hayek (1979) que toda tentativa de impor à sociedade um padrão de distribuição deliberadamente escolhida, seja ele uma ordem de igualdade ou desigualdade, seria inadmissível, Nozick acusa o seu colega na defesa do neoliberalismo de admitir ainda um padrão do que vem a ser o justo. Hayek admitiria que a distribuição deveria se dar de acordo “com os benefícios percebidos conferidos a outros”. O pensador austríaco estaria propondo que a co-operação social não deveria distribuir conforme o mérito moral ou a necessidade, mas conforme “o valor das ações percebidas a serviço dos outros” (Nozick, 1994, p.178). Para ambos os pensadores, o Estado tem que ser mínimo, sem o que ele perderia seu papel de guardião da ordem das aquisições e trocas justas de bens.
Por seu lado, o liberalismo de Rawls recusa não só idéia de Estado mínimo, como também as desigualdades permitidas pelo Estado de bem estar social. Este, diz o autor, é um sistema que permite uma concentração de rendas inaceitável do ponto da justa distribuição.
Rawls propõe que podemos e devemos estabelecer padrões de justiça para regular a estrutura básica da sociedade, o que só pode ser feito por meio de mecanismos institucionais que garantam uma redistribuição “eqüitativa” dos benéficos produzidos pela co-operação social. Seus princípios de justiça buscam garantir acesso a bens primários (renda, direitos, auto-estima etc.) e igualdade de oportunidades econômicas e políticas para todos, como elementos essenciais para uma sociedade bem ordenada. Para que isso ocorra, o poder público precisa intervir na estrutura básica da sociedade, visando restabelecer constantemente a eqüidade social, o que não é, para Rawls, incompatível com o mecanismo descentralizado do mercado.
Os pensadores de tradição marxista, por rejeitarem as bases do liberalismo econômico, apontam que qualquer forma de regular o capitalismo continuaria sendo injusta, por mais que ela avançasse no sentido de estabelecer a igualdade social (Mészáros, 2002, p. 305). O capitalismo deixaria sempre uma parte maior ou menor da sociedade excluída dos benefícios da co-operação social. Isto está inerente ao processo de acumulação do capital. A questão liberal é sempre a de justificar a existência dos menos favorecidos e definir o que a eles deve ser oferecido pela coletividade. Trata-se do debate em torno da definição do valor econômico e ético do mínimo social.

domingo, 10 de abril de 2011

sábado, 9 de abril de 2011

Abril Vermelho




Em pleno Abril Vermelho, tive uma experiência que me incentivou a fazer esta postagem. Na festa de aniversário de 16 anos de minha filha alguns colegas dela estavam conversando sobre bonés, quanto custa, qual era mais legal e quais eles tinham. Para me enturmar fui mostrar meu boné do MST que ganhei dos alunos do PRONERA-UFSCar. Foi ai que eu notei a abrangência do processo de criminalização dos movimentos sociais, todos se comportaram como seu tivesse apresentando algo extremamente subversivo. O engraçado que alguns dos bonés que eles achavam legais traziam associação com o movimento gangasta rap que nas letras e musicas faz uma contundente critica social e são abominados pela mídia conservadora estaduniense.

Site do MST - Clique Aqui

Relatório Elaborado pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos sobre a criminalização dos movimentos sociais, apesar de ser de 2006 ainda é muito atual - Clique Aqui

Histórico do Abril Vermelho no BLOG do DCE da Unicamp - Aqui

André Cordeiro

Sites Imperdíveis I



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